sexta-feira, 6 de maio de 2011

Cervejas norte-americanas na ABS

Na última quarta-feira, dia 27, fui convidado pela ABS (Associação Brasileira de Sommeliers), onde me formei em 2010, a participar de uma degustação de cervejas norte-americanas. Bob Pease, Chief Operating Officer (cargo novo para um sujeito como eu, pouco afeito às peculiaridades do mundo corporativo) da Brewers Association,organização que reúne os cervejeiros artesanais dos Estados Unidos, ministrou uma palestra sobre a atuação destes produtores, afirmando que detêm 5% do total de cerveja produzido no país. Contudo, a pergunta que não quer calar: se eles não estavam procurando representantes ou importadores, qual a motivo da missão cervejeira em terras tupiniquins? Até agora, ninguém forneceu uma resposta satisfatória. Noves fora, vamos ao que interessa, as cervejas. A degustação foi conduzida por Kathia Zanatta, sommelier de cervejas do Grupo Schincariol, que foi, ao lado de Alfredo Ferreira, nossa professora no curso da ABS.

Quem já se aventura pelo mundo cervejeiro há algum tempo sabe que os exemplares norte-americanos são bastante peculiares. Ali, a industrialização massiva a partir da segunda metade do século XX praticamente varreu do mapa as pequenas cervejarias. Mas, a partir de meados da década de 1980, talvez inspirados pelo movimento britânico de recuperação das antigas cervejarias (denominado CAMRA, ou Campaign for The Real Ale), começaram a pipocar focos de resistência. Hoje, segundo Bob Pease, já se contam 1717 cervejarias artesanais nos EUA, um número bastante expressivo. É uma produção que se caracteriza principalmente pela criatividade e ousadia. Baseados em estilos clássicos europeus, os cervejeiros locais criam suas próprias alquimias, algumas ótimas, outras de gosto duvidoso. Adoram lúpulo, misturam de tudo e são felizes assim.


Começamos com a Mid Mountain Mild Ale, produzida pela Epic Brewing Company, de Salt Lake City, Utah. Segundo o site Beer Advocate, trata-se de uma American Blonde Ale. Turva, com um belo tom âmbar claro, é como o nome diz, verdadeiramente “mild” (suave). Com 5,2% de álcool, traz aromas sutis de malte e lúpulo, este um pouco mais marcante, já que leva o famoso lúpulo Saaz da República Checa em sua composição. Na boca, além dos supracitados, agradável sabor de especiarias e pimenta rosa. Ótima drinkability, mas, no conjunto, não impressiona.

Depois, passamos para a Sierra Nevada Torpedo, da cervejaria homônima, localizada em Chico, Califórnia, fundada em 1980. Trata-se de uma IPA (India Pale Ale), o estilo mais popular entre os cervejeiros artesanais daquele país. Robusta, possui 7,2% de álcool. Filtrada, na cor âmbar, tem boa espuma e, como não poderia deixar de ser, aroma intenso de lúpulo, fato reforçado pelo emprego do método “dry hopping”, que consiste em adicionar lúpulo nas fases finais de produção. Neste caso, foram empregadas flores de lúpulo, o que a torna ainda mais rica em aromas herbais, como hortelã, cítrico e pinho. Na boca, é seca, frutada, com algo de damasco, nozes e frutas secas. Muito boa, uma IPA de respeito, cuidadosamente elaborada.







A terceira cerveja é uma spiced (“temperada”) beer ou herbed beer, filhote de Sam Callagione, o maluco responsável pela Dogfish Head Brewery. Leva o nome de Midas Touch Golden Elixir, com a impressão digital no rótulo remetendo ao “toque de Midas”. A receita é, segundo o fabricante, inspirada em uma antiga bebida turca, datada de 2700 anos atrás, com ingredientes originais citados na tumba do rei Midas. Seca e adocicada, o que predomina, tanto no aroma como no sabor, é a uva moscatel, além de madeira, fruta e abacaxi pérola. Talvez pela suavidade da receita, quase não se percebe os 9% de álcool. Os apreciadores da uva Chardonnay certamente vão aprovar. Muito curiosa e interessante, mas somente para um copo ou dois, no máximo.









O próximo exemplar apresenta um belíssimo rótulo e leva o nome de Stone Smoked Porter, com 5,9% de álcool, na cor marrom-escura. É produzida pela Stone Brewing Co. localizada em Escondido, Califórnia. A gárgula, figura mitológica, está presente em quase todos os rótulos da cervejaria e está ali para “proteger a cerveja de males modernos como conservantes, oxidantes e outros”. A mistura, embora original, é um tanto confusa, pois reúne aromas de lúpulo (herbal), café (como toda Porter) e defumado. O olfato fica meio perdido entre tantos estímulos. Nota-se que os ingredientes são de primeira e que o tratamento recebido foi cuidadoso, deixando um aftertaste agradável. Contudo, no conjunto, não agradou.




A última delas é uma cerveja potente, com 11,1% de álcool: Cockeyed Cooper, um produto da Uinta Brewing Company, de Salt Lake City, Utah. Traz um lindo rótulo de inspiração retrô, com um sujeito de óculos (daí o cockeyed, ou “vesgo”). É uma legítima Barley Wine com um toque muito especial, pois é armazenada em tonéis antes usados para uísque Bourbon. Rica, encorpada, fica bonita no copo, com boa espuma bege e líquido vermelho-acobreado. Aromas de lúpulo, damasco, tâmara e madeira. Na boca, é bem seca e frutada. Forte, porém agradável, ótima drinkability. Das cinco cervejas, foi a que mais impressionou.
Agora, é esperar para que mais exemplares dos EUA cheguem por aqui, já que, ao que tudo indica, as Flying Dog não estão mais disponíveis no mercado.

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